O terceiro debate do seminário STF: Defesa da Democracia e o Necessário Respeito ao Devido Processo Legal, realizado na manhã desta quinta-feira (7), teve como foco a tipificação penal de condutas antidemocráticas. Os juristas Juliano Breda e Alaor Leite discutiram os fundamentos e os riscos da criação de novos tipos penais voltados ao combate de ataques ao Estado Democrático de Direito, destacando os desafios jurídicos e os limites constitucionais dessa abordagem. O diálogo foi mediado por Nicolau da Rocha Cavalcanti. Atuaram como curadoras/relatoras as advogadas Anne Kozikoski e Ana Laura Piaia.
Após fazer referência à conferência de abertura do evento (confira aqui), o mediador passou a palavra a Alaor Leite, em apresentação remota diretamente de Portugal, com uma provocação: os crimes contra a democracia foram colocados dentro do Código Penal? Foi apenas uma mudança topográfica? Ou houve uma mudança de fundamento?
Questionado pelo moderador sobre a interpretação dos crimes contra a democracia, Juliano Breda alertou para a escassez de tipos penais para condutas antidemocráticas e para as fragilidades dogmáticas da tese acusatória relativa aos atos de 8 de janeiro de 2023.
Confira os principais momentos do debate:
“Convém entender quais caminhos e descaminhos nos conduziram a substituir a Lei de Segurança Nacional por um novo conjunto de leis que definem crimes contra o Estado Democrático de Direito. Isso é fruto de uma agitação história que precisa ser compreendida. Além da história, temos de analisar o sentido e a aplicação.” – Alaor Leite
“Ao observar o percurso histórico do pais, vemos que o primeiro modelo de proteção do Estado, na Constituição de 1824, era muito próximo do atual. Esse modelo sai do Código Penal e toma uma via paralela pelas mãos de Nelson Hungria. É estranho que modelo de segurança nacional tenha convivido desavergonhadamente com o modelo de segurança nacional.” – Alaor Leite
“Ingenua ou arrogantemente, na redemocratização acreditamos que adormecer a Lei de Segurança Nacional era um caminho parcimonioso. Não sem protestos, que no geral vieram da OAB. Já em 1986, Evandro Lins e Silva, Nilo Batista e René Dotti construíram um modelo de defesa do Estado do Direito com argumentos incrivelmente atuais. O projeto, contudo, não prosperou.” – Alaor Leite
“O sentido do modelo de proteção do Estado de Direito atualmente vigor é o do balanceamento entre uma democracia que não se quer ingênua nem arrogante, mas também que não nos leve a garrotear a liberdade de expressão.” – Alaor Leite
“Quero celebrar a atitude de vanguarda da OAB do Paraná em organizar este debate. É o único evento que se dedicou a enfrentar os grandes temas de matéria criminal em discussão no STF e, sobretudo, o único realizado no momento em que qualquer crítica ao Supremo leva a um terreno pantanoso que tende a calar o debate.“ – Juliano Breda
“Alguns países têm mais de 10 tipos penais para criminalizar ataques ao Estado Democrático de Direito. Nós nos contentamos com dois. Aqui precisam estar presentes elementos como o uso da violência e a grave ameaça. Me parece um equívoco.“ – Juliano Breda
“O discurso da Procuradoria Geral da República nessa acusação do 8 de janeiro é muito fraco. A denúncia cita por várias vezes a expressão “governo legitimamente eleito”. Mas o tipo penal da tentativa de golpe de Estado não fala nisso. Cita, isto sim, um governo legitimamente constituído. O governo se constitui em 1º de janeiro, com a posse. O efeito disso é que não se pode falar em início da execução do crime antes da posse. Mas a PGR cita fatos anteriores a 1º de janeiro.“ – Juliano Breda
“Aponto uma fragilidade dogmática: a tese acusatória claramente não é de autoria, mas de participação no golpe de Estado. Embora a PGR sustente que Jair Bolsonaro é autor dos crimes, como principal beneficiário e maior articulador, toda a argumentação fala em participação, em incitação — e não em autoria. É evidente que a tese acusatória gira sempre em torno dos verbos instigar, incitar, incentivar e influenciar. E sabemos a diferença entre autoria e participação.” – Juliano Breda
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