Presidente da Seccional diz que falta controle da corrupção no Brasil

Em reportagem publicada no domingo (15), Dia da Proclamação da República, o jornal Gazeta do Povo avaliou os altos e baixos da República brasileira. Na opinião do presidente da OAB Paraná, Alberto de Paula Machado, ouvido pela reportagem, a falta de controle da corrupção é um dos indicativos da baixa cultura da república no país. Confira a reportagem na íntegra:

Os altos e baixos da República
Para especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o Brasil ficou com média de 5,3 em relação ao cumprimento de temas considerados republicanos

Cento e vinte anos após a proclamação, a sociedade brasileira ainda precisa trabalhar muito para tornar o país uma República plena. É o que indica levantamento feito pela Gazeta do Povo, com 28 especialistas das áreas de Ciências Sociais, Jornalismo e Direito, que responderam a um questionário com 31 temas considerados republicanos. Numa escala de zero a dez – em que dez indica uma República em sua plenitude e zero, a ausência total de Estado – o Brasil ficou com média 5,3. Na percepção dos especialistas consultados, o país vai bem quando se trata de participação política e eleições. Já quando se trata de cultura republicana, do uso dos recursos públicos para o bem comum, o Brasil vai muito mal.

A partir das respostas dadas por cientistas sociais, jornalistas e operadores do Direito foi composto um índice, que foi subdividido em quatro subtópicos: participação política, organização do Estado, cultura republicana e direitos fundamentais . Para cada um dos temas analisados, os especialistas foram convidados a responder a pergunta: “A República brasileira, como um todo, atende (e em qual grau) os seguintes princípios do republicanismo?”

Embora a história da República brasileira seja descontínua, entrecortada com períodos ditatoriais, o país foi mais bem avaliado no subíndice “Participação política/Escolha de agentes públicos”. Obteve média 6,4. Esse tópico trouxe temas que estão relacionados com as ideias de eleições populares e livres, alternância de poder e participação direta nas decisões. Os especialistas consideram que o Brasil atende de forma satisfatória temas como eleições periódicas (8,9), tempo de mandato (8,1), voto secreto (8,3) e universalizado (8,4). Porém, quando se trata da idoneidade como requisito para a condição de acesso a cargos públicos, os especialistas consideram que hoje o atendimento a esse quesito é baixo. O tema foi o pior avaliado entre todos os 31 itens pesquisados. “Esse é um dos pontos frágeis da República”, afirma o professor de Ética e Ciências Políticas, Roberto Romano, da Universidade de Campinas. “Enquanto houver normas como privilégio de foro, estaremos dando autorização para delinquir.”

Outro item mal avaliado foi o referente a mecanismos de participação da sociedade nas decisões públicas, que ficou com média 3,4. Na avaliação do professor de Direito Constitucional Clèmerson Merlin Clève, este é um tema no qual há um longo caminho a se percorrer. “O brasileiro ainda não se vê como sujeito capaz de, civicamente, participar da história de sua pátria. Vê-se, muitas vezes, como alguém com direitos. Ou, mesmo, como destinatário de políticas governamentais”, afirma Clève. “Não como alguém que pode e deve fazer diferença na esfera pública.”

O subíndice “Organização do Estado”, que tratou dos temas Estado laico, equilíbrio entre entes federados e independência e harmonia entre os três poderes, foi o segundo melhor avaliado com média 5,5. O que fez a média do subíndice subir foi a avaliação feita sobre Estado laico, que obteve média 7. No que se refere à independência e controle mútuo entre poderes, que ficou com média 4,9, Roberto Romano afirma existir uma crise entre os poderes. “Temos um Executivo que legisla, um Congresso que não fiscaliza e um Judiciário que ameaça legislar. Não existe harmonia.” Já em relação ao equilíbrio das relações entre os entes da federação, que obteve média 4,6, o jurista Ives Gandra Martins faz uma crítica à concentração de recursos na esfera federal. “Com 70% do bolo tributário, a União sufoca os outros entes federativos, obrigando-os a, de pires na mão, pedirem sempre recursos ao governo central.”

Desigualdade
A desigualdade social é um dos motivos que levam à fragilização da República brasileira. A avaliação é de parte dos especialistas consultados pela Gazeta do Povo, ao analisar os diversos temas do subíndice “Direitos Fundamentais”. A questão da igualdade de condições apareceu em respostas a temas como “amplo acesso à Justiça”, “igualdade perante a lei”, “igualdade de oportunidades”, “direitos das minorias”, e “direitos humanos”.
Para Roberto Romano, da Unicamp, o Brasil é uma República que precisa “caminhar” muito para se tornar um Estado Democrático de Direito. “O Brasil não é uma República democrática, porque não abre espaço para a soberania popular, não possibilita igualdade para todos e não distribui a justiça de forma igualitária.” Romano considera que o principal problema do Estado brasileiro é ele ser constituído de oligarquias regionais, “que formam guetos aristocráticos no país”.

A desigualdade social e política da população também é apontada pelo presidente da Federação Nacional dos Jornalistas, Sérgio Murilo de Andrade. Ele considera que, embora o Brasil tenha avançado bastante após a redemocratização, a noção de República ainda não é sólida. “Há uma dívida imensa com a parte da população que está excluída da vida econômica e política do país. Enquanto isso permanecer, a noção de República é mais conceitual que real.” O professor de Direito Luiz Edson Fachin, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), critica o fato de a igualdade de oportunidades ser meramente formal, não tendo repercussão efetiva na vida das pessoas. “A real igualdade ainda é, para grandes segmentos da população brasileira, um sonho.”

Baixa cultura
Controle da corrupção foi o pior item analisado e proporcionou a queda do índice de avaliação da República brasileira
A cultura republicana no Brasil é baixa. Essa é a opinião dos especialistas das áreas de Direito, Jornalismo e Ciências Sociais consultados pela Gazeta do Povo, ao analisar o tópico que tratou de temas como corrupção, transparência dos governamentais, responsabilização de agentes públicos, respeito à lei e ausência de patrimonialismo. O subíndice “Cultura Republicana” obteve média 3,5, e foi o fator predominante para a queda no índice de avaliação da República brasileira. Se fosse suprimido o tópico, o índice subiria de 5,3 para 5,8.

O item mais mal avaliado foi o referente ao controle da corrupção pelo Estado (2,9). Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), Alberto de Paula Machado, o sistema de controle no Brasil é praticamente inexistente. “Especialmente porque as estruturas dos tribunais de contas atuam apenas depois de os gastos já terem sido realizados e as contas apresentadas, não detendo o poder de impedir despesas irregulares”, afirma.
Já o cientista político Sérgio Amadeu, professor do Mestrado de Comunicação da Faculdade Cásper Líbero, considera existir apenas um combate formal à corrupção. “Há muito discurso e poucas medidas estruturais de combate. No Brasil, há um vínculo entre poder político e poder do dinheiro.”

O tema “ausência de práticas patrimonialistas”, também foi mal avaliado. O comentarista político Luiz Geraldo Mazza lembra que o patrimonialismo permeia as relações sociais brasileiras. “Por isso o Brasil está muito longe de ser uma República.” E o professor de Ciências Políticas, Adriano Codato, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), destaca que a persistência do nepotismo – mesmo após a aprovação da Súmula Vinculante n.º 13 (que proibiu a prática) – é um dos sintomas do patrimonialismo.

No que se refere à transparência dos atos públicos, Mazza afirma que hoje existe apenas uma “simulação” com a criação de portais de informação. Para ele, não há abertura real dos dados públicos. Já o professor de Direito Constitucional Clèmerson Clève, da UFPR, diz acreditar que o país está melhorando no quesito transparência. Clève afirma que o problema não é somente o de omissão de dados. Ele diz estar preocupado com os rumos que vêm tomando a propaganda oficial que, em vez de ser informativa, acaba sendo usada para promoção dos governos.

Fonte: Gazeta do Povo

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