Pereira e Peregrino divergem sobre decorrências da cassação do mandato

O direito eleitoral é um exercício de fé. Com essa declaração o mediador Luciano Guimarães Mata abriu, no V Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, o debate sobre as decisões de cassação do mandato à luz da minirreforma eleitoral (Lei 13.165) de 2015 e da recente decisão do Supremo Tribunal Federal, que permite o cumprimento da pena a partir da sentença condenatória em segundo grau.

Para Marcelo Peregrino, juiz do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, vale para a lei eleitoral o princípio da presunção da inocência que está na Convenção Interamericana de Direitos Humanos, à qual o Brasil se filia. “O tema foi analisado pelo STF em 2008 e prevaleceu a noção da supralegalidade dos tratados internacionais”, lembra ele.

Peregrino entende que, como cabe a cada Estado signatário definir o conceito do que seja a constatação da culpa, limite para a presunção da inocência, e como no Brasil este limite é dado constitucionalmente pelo trânsito em julgado, a aplicação cabe também ao direito eleitoral. Para ele, a Lei da Ficha Limpa e a recente decisão do STF sobre a condenação após sentença em segundo grau, viola o princípio pro persona do artigo 283 do Código de Processo Penal.

Para ele, o caminho da jurisprudência vai ser afastar a necessidade do trânsito em julgado e realizar as eleições a partir da decisão em segundo grau, com o candidato mantido no cargo até que isso ocorra.

O conselheiro estadual da OAB Paraná, Luiz Fernando Pereira, especialista em Direito Eleitoral, tem outra visão: “Sobre esperar no cargo até o julgamento, Peregrino diz que é bom; eu digo que é ruim.”. Para ele, a compreensão defendida pelo juiz equivale a colocar o direito eleitoral, que precisa de celeridade, num cenário próprio das relações privadas, regidas pelo Código de Processo Civil. “A presunção da legitimidade e da soberania popular vai até a sentença condenatória. Além disso, não se deve vincular o efeito suspensivo com a garantia de duplo grau de jurisdição”, argumenta. Pereira lembra que há quem pergunte quem devolve o tempo perdido com acusações infundadas. “Eu quero saber é quem devolve o tempo de mandato em que a soberania foi violada”, contrapõe.

Proteção

A afirmação de Pereira de que o recurso do candidato cassado só interessa ao réu e de que o eleitor tem direito a um processo eleitoral limpo, bem que deve ser protegido, foi contraposta por Peregrino com o argumento de que o juízo do eleitor é relacional. “Os frutos da condenação do primeiro colocado não seriam necessariamente colhidos pelo segundo colocado”, afirma o juiz, para quem o grande valor a ser preservado é o da legitimidade das eleições. Deixar de convocar novas eleições, para ele, equivale a emendar um soneto ou retificar uma carta de amor.

Para Pereira, a resistência de quem prefere a espera pelo trânsito em julgado, está fundada num preconceito, nem sempre confesso: a ideia de que o juiz não deve interferir. “Eu digo: gosto que o juiz ponha a mão. Ele cassa para restabelecer a verdadeira soberania popular que havia sido atacada pelos abusos do candidato”, resume.

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