Juristas fazem uma avaliação dos pontos positivos e negativos do Marco Civil da Internet

A OAB Paraná promoveu nesta semana um ciclo de palestras sobre a Lei 12.965, o Marco Civil da Internet, aprovado há menos de um mês pelo Congresso Nacional. Convidados para falar sobre o tema, o advogado paulista Renato Ópice Blum e os juristas paranaenses Luiz Edson Fachin e Rodrigo Xavier Leonardo fizeram uma análise da primeira lei que regula o uso da internet no Brasil. Ópice Blum, uma das principais autoridades no assunto, abordou os aspectos técnicos e práticos da legislação, enquanto Fachin apresentou uma análise constitucional e Xavier Leonardo se concentrou na questão da liberdade de expressão.

A aprovação do marco civil da internet foi festejada como sendo resultado da participação popular e um modelo de regulação a ser copiado por outros países, apresentando-se como uma espécie de Constituição para internautas e provedores, com princípios, fundamentos, direitos e deveres. Apesar disso, o texto é passível de críticas e um dos pontos criticados pelos especialistas convidados foi o da responsabilidade dos provedores de conexão por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros. Em seus artigos 18 e 19, a lei diz que os provedores não são civilmente responsáveis. Só serão responsabilizados se não respeitarem ordem judicial específica para tornar o conteúdo indisponível.

Para  Ópice Blum e para Fachin, essa premissa representa um retrocesso, que está na contramão do que a jurisprudência já vinha decidindo. O advogado paulista considera que esperar uma ordem judicial para remover um conteúdo não é compatível com a velocidade que as informações circulam na web. Segundo ele, a noção de tempo no mundo virtual não é a mesma do mundo real, sendo muito provável o perecimento de um direito.

“Não me parece adequada esta imunidade de responsabilidade que se criou aos provedores”, disse Fachin, lembrando que  havia uma jurisprudência relativamente estável, especialmente no Superior Tribunal de Justiça, em matéria de responsabilidade dos provedores.  “Em momento algum esse marco fala de responsabilidade solidária, se desviando de alguns precedentes judiciais que indicavam nessa direção”, disse.

De acordo com o jurista, o marco civil deveria privilegiar mecanismos que dispensam o caminho judicial para que se possa evitar a propagação de uma determinada lesão a direito de personalidade.
“Houve retrocesso na judicialização dos procedimentos, como se nós todos fôssemos obrigados a parar no sinal vermelho porque agora há uma ordem judicial”, compara. “Os imperativos jurídicos hão de pressupor os imperativos éticos, e esses imperativos éticos comandam uma sociedade que se orgulha de si mesma e dos seus valores, e que não depende freudianamente do grande pai, Estado-juiz, para restabelecer e dirimir todas as controvérsias”, ensina.
 
Elogios
– Em que pese algumas críticas, o Marco Civil da Internet recebeu elogios em alguns aspectos. Renato Ópice Blum acompanhou toda a evolução legislativa que resultou na lei 12.965, desde início dos anos 2000, quando surgiram os primeiros projetos. Sua posição sempre foi contrária à criação do marco civil, por considerar que a Constituição e a legislação já existente dão conta de amparar direitos e exigir obrigações no campo da internet. Na sua opinião, o que deveria ter sido feito é um combate mais efetivo em relação aos crimes de internet, com a elaboração, portanto, de uma lei penal, e não civil.

“Sempre me posicionei contra o marco civil, continuo me posicionando contra, agora com algumas exceções. Existem dispositivos interessantes. Tenho críticas fortes, mas para algumas situações tenho elogios”, disse Ópice Blum. Ele aponta como pontos positivos do marco civil  o artigo 7º, que garante a proteção dos dados dos internautas; o artigo 21, que numa exceção à não responsabilidade, responsabiliza subsidiariamente o provedor que não retira do ar cenas de nudez após recebimento de notificação do participante; e o artigo 26, que determina a implementação da educação digital.

Fachin aponta como ponto interessante da lei a proclamação da comunicação e da liberdade de expressão como direitos fundamentais. “A palavra liberdade aparece com a devida entonação, no sentido plural. É uma lei que não tem o selo de governo algum, é uma lei da sociedade brasileira”, disse o jurista. Se a judicialização, em certo ponto foi considerada negativa no caso da responsabilização dos provedores, de modo geral ela traz como vantagem evitar excessos, tanto do usuário quanto do provedor. Na opinião de Fachin, a lei também tentou acertar na questão da segurança jurídica, ao exigir a fundamentação na decisão de retirar da rede o conteúdo tido como ilegal. O jurista ressalvou que a lei não deu conta de alguns aspectos importantes, como o direito ao esquecimento contrabalançado com o direito à memória. “Há casos em que o direito de ser esquecido e o direito ao esquecimento se colocam na justa medida sem que isso implique no direito à censura”, destacou. 

Quanto à liberdade de expressão, Rodrigo Xavier Leonardo avalia que há um compromisso da lei do marco civil com esse direito fundamental,que permeia todo o conjunto de normas. “A liberdade de expressão está nos fundamentos e nos princípios da lei, integra o plexo dos direitos dos usuários como condição para o pleno exercício de acesso e está na limitação da responsabilidade do provedor de aplicação. A liberdade de expressão é, portanto, um alicerce do marco civil da internet”, disse Xavier Leonardo.

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