Dando enfoque à questão da (falta de) saúde no Brasil, Sarlet fez rir para não chorar: Se um alienígena pousasse no Brasil, no momento em que ele lesse nossa Constituição, ele se mudaria para cá imediatamente, se instalaria aqui pensando que é o melhor país do mundo, pois pensaria que teria saúde, educação, coisas que ele jamais sonharia ter em seu mundo desenvolvido do além. No momento em que entrasse na fila do Sistema Único de Saúde (SUS), ele voltaria correndo, talvez destruindo antes o país, para ninguém mais pousar aqui.
Por isso, sem negar que o SUS seja uma conquista, Sarlet afirmou que o Sistema precisa ser repensado: Porque o universal nunca foi e é cada vez menos, o igualitário é cada vez mais discriminatório, o integral está cada vez mais parcial, e o gratuito nunca foi. Para solucionar os problemas, ele apresentou diversas propostas, como a solidariedade com subsidiariedade entre os entes no atendimento à questão da saúde, distribuindo corretamente as competências, a priorização da prevenção, orçamento impositivo em saúde e educação, além de aplicação da sustentabilidade ao Sistema.
Sustentabilidade significa sacrifício, economizar recurso hoje para sobrar para amanhã. Isso é quase tabu. Ninguém quer fazer isso. Isso não dá voto. Dá protesto. Só que é assim que funciona, em qualquer lugar do mundo, disse. E completou: Resumidamente, acho que se nós não tomarmos isso mesmo a sério, nós é que teremos que nos mudar para o planeta daquele alienígena.
Nova constituinte?
Em seguida, o advogado Zulmar Fachin, professor da Universidade Estadual de Maringá, partiu de uma abordagem do poder constituinte para criticar muitas propostas reformadoras que pululam no meio político. Segundo ele, nos últimos 21 anos, o Brasil teve seis emendas de revisão e 83 emendas constitucionais: Somente neste ano, foram sete emendas constitucionais. Contando os apenas os dias úteis (segundo a agenda de Brasília, ou seja, entendidos como dias de trabalho apenas terças, quartas e quintas-feiras), Fachin chegou a um dado assustador: Na média desses 21 anos, tivemos uma emenda constitucional a cada dois meses de dias úteis. Isso não é poder constituinte, porque o poder constituinte é excepcional. Isso parece mais um poder comum, um poder ordinário, às vezes duplamente ordinário.
Para ele, houve emendas importantes, mas muitas outras teriam sido meramente burocráticas, que apenas satisfazem o discurso permanente de mudança. Assim, avaliou que o Brasil precisa de reformas, mas apenas aquelas que efetivamente sirvam à concretização dos direitos dos cidadãos: Nós temos que lembrar que somos a 6ª economia do mundo e o 79º em indicadores sociais. Então, quais reformas nós devemos fazer? A reforma para erradicar a pobreza, para reduzir o analfabetismo, para eliminar o déficit de 10 milhões de moradores.
Ao final, ele se mostrou firmemente contrário às propostas de constituinte exclusiva, sugerindo à OAB que também se posicione frontalmente contra uma constituinte exclusiva, completando: A gente não pode brincar de Assembleia Nacional Constituinte, que a gente sabe como começa e não sabe onde termina.
Nova jurisdição constitucional
Por fim, mas não menos contundente, o procurador aposentado do Ministério Público do Rio Grande do Sul, agora advogado, Lenio Streck falou sobre sua cruzada nacional com relação ao problema sério que é a questão do modo como se decide no Brasil e como isso está fazendo mal para a democracia. Segundo ele, o ativismo judicial brasileiro acabou sendo uma vulgata da judicialização, explicando que o Poder Judiciário acaba substituindo o legislador e o Poder Executivo e colocando os seus pressupostos éticos e morais para dentro da política. Assim, o ativismo enfraquece a política e a cidadania, criando cidadãos de segunda classe, que para tudo recorrem ao Pai Judiciário.
Em continuação à sua crítica à jurisdição, Streck atacou um falso entendimento dos princípios, considerados equivocadamente como valores capazes de corrigir a própria Constituição: Estamos vendo hoje aquilo que eu chamo de fofura judiciária, fofura doutrinária, são princípios fofinhos que não têm normatividade, mas que o pessoal usa para valer mais do que a própria legislação.
Nesse sentido, o juiz boca da lei foi substituído pelo juiz dono da lei, que faz o que quiser com ela, que julga conforme o que pensa ser justo: Mas justo para quem, cara-pálida?, perguntou. Decidir não é escolher, afirmou Streck, completando que, ao decidir, o juiz tem responsabilidade política: E, com essa responsabilidade política, eu não posso fazer com que o seu direito dependa das minhas subjetividades.

