OAB Paraná debate prós e contras da MP da Liberdade Econômica

A OAB Paraná realizou nesta terça-feira (4) um debate sobre a Medida Provisória da Liberdade Econômica (MP 881). O evento foi organizado pelas Comissões de Inovação e Gestão, Direito Empresarial e Direito do Consumidor e transmitido na página da OAB Paraná (confira aqui). Participaram do debate os advogados Egon Bockmann Moreira, Laís Gomes Bergstein e Marcia Carla Pereira Ribeiro.

Ao iniciar as exposições, Moreira, que também é professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), explicou que traria um histórico anterior à MP 881. “A MP gera algumas dificuldades e ela tem uma história que talvez explique essas dificuldades”, sintetizou. Ele integrou um grupo de nove juristas que elaborou o projeto de Lei Nacional da Liberdade Econômica, sob a coordenação de Carlos Ari Sundfeld.

Moreira explicou que a pretensão do grupo era que a lei tivesse abrangência federativa. “Seria uma lei que advinda do Congresso Nacional, que vincularia União, estados e municípios“, definiu. O jurista observou que no Brasil não existem temos normas de direito econômico. “Precisamos de normas que prestigiem a liberdade econômica como direito fundamental. É preciso inverter a lógica de que precisamos de autorização do Estado para exercer da liberdade econômica. Precisamos estabelecer que o  Estado precisa da nossa autorização para limitar nossa a liberdade”, argumentou.

O advogado apontou que o PL tinha como preocupação três eixos, com os quais a MP se preocupa parcialmente: o direito à liberdade econômica; a instabilidade; e o fato de que o excesso de regulação traz dilemas e desafios para quem quer empreender.

Um dos pontos fracos da MP é que não se aplica a estados e municípios. “A ideia era ter uma lei nacional que estabelecesse uma legislação multinível. Fazer com que houvesse uniformidade de legislação pertinente à regulamentação”, explicou Moreira. Ele lembrou ainda que apesar de estar prevista na Constituição, a liberdade econômica não faz parte da realidade do Brasil. “A regra constitucional que vige no Brasil há mais de 30 anos é da liberdade econômica. Mas nós vivemos o contrário”, descreveu.

O professor da UFPR citou uma série de exemplos do que considera ser um exagero na regulamentação, como normas que definem distância mínima entre postos de combustível, quantidades de determinados tipos de produtos que devem ser vendidas ou como devem ser feitas as cobranças de ingressos.

Ao finalizar, Bockmann Moreira sustentou que a liberdade econômica é, ainda, uma maneira de combater a corrupção. “Quanto maior a concentração de poder político para liberar licenças, maior a concentração do poder econômico. Uma técnica para combater corrupção, além de leis anticorrupção, é a criação de normas que estimulem e institucionalizem a livre concorrência”, defendeu.

O advogado pontuou que a MP “tem boas intenções, mas tem muito o que melhorar, pois é muito mal redigida”. “A medida provisória instala ideia que é possível fazer normas que inibam as limitações que o Estado faz às nossas liberdades econômicas. Traz a ideia de que quem deve limitar alguém aqui é a livre iniciativa”, concluiu.

Direito do consumidor

A advogada Laís Gomes Bergstein fez uma análise sob o ponto de vista do Direito do Consumidor. “Precisamos ter desburocratização, mas não podemos ter isso como forma de mitigação dos deveres de proteção dos consumidores”, sustentou a advogada, que é doutora em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com ênfase em Direito do Consumidor e Concorrencial.

Laís observou que no âmbito da Comissão de Direito do Consumidor tem sido discutido o que seriam atividades de baixo risco, que de acordo com a MP não necessitariam mais de autorização para serem realizadas. “Seriam baixo risco econômico ou baixo potencial de produção de danos?”, questionou. Ela apontou que, quem já teve uma intoxicação alimentar, não considera uma atividade de venda de alimentos, por exemplo, como de baixo risco.” Essa leitura deve ser coerente. Não podemos em prol da liberdade econômica aumentar os riscos do mercado”, ponderou.

A advogada ressaltou a importância de políticas públicas de redução de desigualdade e incentivo da economia. “Mercado saudável precisa de concorrência, conformidade com a lei, informação, segurança jurídica”, definiu. “Buscamos sensatez. Para termos mercado saudável, precisamos ter consumidores. Não existe mercado e atividade econômica sem consumidor. E não temos um mercado saudável, não temos o tratamento legislativo adequado para consumidores”, considerou.

A especialista em direito do consumidor citou que, para os padrões do Banco Mundial, o tratamento do superendividamento das pessoas físicas está no centro das politicas para evitar a pobreza e promover o empreendedorismo. Ela lembrou que hoje, no Brasil, os cinco maiores bancos do país controlam 84,8% da concessão de crédito.

Para Laís, a MP 881 é só mais uma árvore e seria necessário um bosque para que ocorressem a alterações necessárias. “A MP não se dirigirá aos fins que se propõe”, avaliou.

Direito societário

A advogada e  professora titular da Pontifícia Universidade Católica do Paraná Marcia Carla Pereira Ribeiro apresentou sua interpretação da MP a partir do viés do direito societário e observou o impacto que uma nova norma pode ter no mercado no meio empresarial. “Precisamos de trabalho. Não temos que prestigiar a ação de consumo como um fim em si mesma”, definiu. “Não é o consumo o mais relevante, mas que as pessoas trabalhem e tenham dinheiro para consumir. Precisamos ter estabilidade, ninguém investe em país instável”, discorreu.

“Não estou dizendo que o pacto regulatório seja exclusivamente o que gere lucro, mas tem que ser pensado e sopesado”, explicou a professora. “É preciso que o investidor saiba que a responsabilidade dele é limitada, não é inexistente”, acrescentou.

Marcia Carla observou ainda a importância da ética na condução das políticas públicas e na aplicação das normas. “Ao contrário do que se pensa, os ambientes econômicos éticos são os que mais geram desenvolvimento”, afirmou.

Ao sintetizar sua opinião sobre a MP, ela a classificou como “uma carta de intenções”. “Não traz significado absoluto, mas traz uma mensagem”.

Startups

O presidente da Comissão de Inovação e Gestão, Rhodrigo Deda, fez uma apresentação sobre a importância de a legislação se adequar às necessidades dos novos negócios. “Os empreendedores de startups estão aí prontos para fazer negócios”, ressaltou. “Temos que começar a dar segurança para que novos mercados possam se formar. Essa MP tem que ser mais que uma boa intenção”, considerou Deda, lembrando que a matéria ainda deve passar por alterações.

Em seguida, o debate foi aberto para que os presentes fizessem perguntas aos participantes.