Tarde de sábado é dedicada a debates sobre feminismo no 1º Encontro Virtual das Advogadas Paranaenses

A seccional realizou nesta tarde de sábado (8/8) o 1º Encontro Virtual das Advogadas Paranaenses, com transmissão ao vivo pelo Zoom e pelo canal da ESA da OAB Paraná no Youtube. Na saudação aos participantes, o presidente da OAB Paraná, Cássio Telles, ressaltou que espera que o trabalho da gestão reverta em mais participação das mulheres na seccional. “Percebo que estamos num caminho de avanços, com mais mulheres interessadas nos temas da advocacia e prontas para uma atuação na Ordem”, afirmou.

Telles lembrou das diversas lutas que merecem atenção neste momento peculiar da história. “Parabenizo, portanto, a Comissão da Mulher Advogada por fomentar uma discussão sobre feminismo, não para promover divisão, mas para aumentar a inclusão. Destaco o compromisso da OAB Paraná com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU, especialmente os objetivos 5 e 10, que tratam da igualdade, uma meta que queremos alcançar logo”, frisou. “Não acredito em felicidade sem igualdade”, acrescentou.

Também tomaram parte da abertura as advogadas Mariana Lopes e Caroline Farias, respectivamente presidente e vice-presidente da Comissão da Mulher Advogada da seccional. “A participação dos homens não é só bem-vinda, mas necessária em eventos como esse”, destacou Mariana. “Hoje temos a oportunidade de desfazer preconceitos sobre o que é e o que não é feminismo”, pontuou Caroline.

Definição

O encontro contou com uma discussão literária e quatro painéis. No primeiro deles, a vice-presidente da OAB Paraná, Marilena Winter, discorreu sobre o que é feminismo, tomando como ponto de partida um pensamento da filósofa Marcia Tiburi e o contexto cultural em que nos encontramos. “Vivemos um momento bastante interessante, pois apensar das tensões elevadas, se abre um caminho possível para a transformação do papel da mulher. Afinal, apesar dos avanços, os estereótipos não mudaram muito. Na construção jurídica, a mulher pouco ou nada foi considerada. O campo público, onde se dá a política, a troca de conhecimento e a produção, tem sido historicamente masculino. À mulher cabiam apenas tarefas ligadas ao cuidado com a casa e os filhos, que nem são consideradas trabalho por não ser remunerado. Esse estigma, me parece, ainda não conseguimos vencer; está impregnado em nosso inconsciente”, observou. “O que é feminismo? É algo capaz de nos proporcionar um mundo melhor, mais igualitário e com espaço para a transformação”, finalizou.

A advogada Sandra Lia Leda Bazzo Barwinski, vice-presidente da Comissão de Estudos sobre Violência de Gênero da seccional e co-coordenadora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher no Brasil, traçou um panorama histórico do feminismo. “Algumas pautas são essenciais para o feminismo: direito ao trabalho, direitos civis, direito ao corpo… Mas destaco o direito ao saber, provavelmente a mais antiga reivindicação feminista. O conhecimento embasa a luta pelos demais direitos. E a OAB Paraná vem lutando pelo direito à educação, por isso expresso meu agradecimento”, declarou na fala inicial. Sandra citou a obra de Michelle Perrot, ressaltando aspectos que contribuíram para que o homem fosse naturalizado como protagonista da História. A advogada também mencionou lutas como o sufragismo e, no Brasil, os direitos consagrados na Constituição e no Código Civil de 2002. “Não podemos esquecer da Lei Maria da Penha, fruto do intenso ativismo das mulheres. O direito é um instrumento para a conquista das mulheres”, frisou.

Ondas

As ondas feministas foram o tema abordado por Maria de Lourdes Santa de Souza, ativista da Marcha Mundial das Mulheres e do Movimento das Mulheres Negras de Curitiba. “Ao longo da história as mulheres se organizaram em massa para reivindicar direitos. Fala-se em três grandes ondas. O movimento organizado surgiu no início do século XIX, mas a luta feminista é anterior a isso”, disse, citando Cleópatra, Tereza de Benguela e outras mulheres. “Até metade do século XX, a luta foi por direito ao voto e à participação política. As mulheres negras nessa primeira onda lutaram pelo abolicionismo”. Na segunda onda, prosseguiu, a luta foi contra a opressão, pelos direitos reprodutivos e pela igualdade de gênero. Nos anos 90, a terceira onda trouxe especificidades como a luta das anarquistas e das mulheres negras. “Agora setores da academia já falam numa quarta onda, marcada pelo uso maciço das redes sociais”, apontou. Santa de Souza fechou sua apresentação citando a comunidade amorosa e o ideal de liberdade de justiça defendidos na obra da ativista Bell Hooks.

Nanci Stancki da Luz, vice-presidente do Conselho dos Direitos da Mulher de Curitiba, falou sobre a riqueza do feminismo, uma vez que é composto por uma multiplicidade de formas de ser e sentir. “Queremos as diferenças respeitadas e contempladas nas nossas demandas”, declarou. Para Nanci, nesse contexto, não é feminista negar a história das mulheres nem assumir que o único relato válido da história é o dos grandes feitos. “Temos até de discutir que grandes feitos são esses. Nos relatos históricos são castelos, pontes, batalhas… Mas por que os cuidados do espaço doméstico não podem ser também considerados grandes feitos?” questionou. Para ela, não se pode achar normal que mulheres estudem mais e ganhem menos, que tenham carga maior na divisão do trabalho doméstico ou que políticas em prol da igualdade de gênero sejam atacadas. “Não é feminista também educar meninos e meninas de modo distinto, cultivar a ideia das super-mulheres, nem assumir que temos de respeitar de forma incondicional todas as culturas, mesmo a que oprimem as mulheres”, pontuou.

Diferenças

Ao fim das quatro exposições, o evento seguiu com um debate sobre o livro “Sejamos todos feministas”, moderado pelo advogado, professor e conselheiro seccional Rodrigo Luís Kanayama e ampliado com as participações de representantes de comissões da mulher advogada de subseções da OAB no Paraná — Adriana Vasconcellos Dandolini (Foz do Iguaçu), Helen Karina Ilha (Pato Branco), Juliana Milek (Almirante Tamandaré), Patrícia Finamori Koschinski (Rio Negro) e Valéria Canalle (Paranavaí). A obra escolhida foi escrita pela nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie em 2014, tendo como ponto de partida uma apresentação TED Talk proferida dois anos antes. No ensaio, a autora defende que o feminismo é essencial para homens e mulheres e deixa claro que essa libertação deve ser buscada com respeito pelas diferenças óbvias entre os gêneros e os diferentes contextos sociais que coexistem no mundo.

“Destaco o trecho em que Chimamanda diz que meninos e meninas são inegavelmente diferentes em termos biológicos, mas completa lembrando que a socialização exagera essas diferenças. É preciso ensinar igual respeito e consideração a todos e incentivar a participação dos mulheres nos mais diversos setores. Creio que esse livro deve ser lido por todos, porque levanta questões atuais e que merecem a reflexão geral”, frisou Kanayama.