Jurisprudência e efetividade da execução em debate no Seminário de Processo Civil

A manhã do segundo dia o Seminário de Processo Civil em Memória do Professor Egas Dirceu Moniz de Aragão, promovida pela Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB Paraná, contou com dois painéis temáticos. O primeiro versou sobre recursos, meios autômatos e impugnação de jurisprudência, tendo como presidente de mesa o pós-doutor Sandro Kozikoski e como painelistas o desembargador fluminense Alexandre Freitas Câmara, doutor em Direito Processual; Daniel Mitidiero, pós-doutor em Direito; e o procurador Regional da República, Elton Venturi, doutor em Direito, como painelistas.

“Tenho certeza de que todos nutrem imenso respeito pelo advogado, mas também pela figura humana que foi Egas Moniz de Aragão. Quando ingressei na UFPR, ele já estava aposentado, mas seu legado permanecia. Destaco o lado visionário do professor. Em 2003 ele já chamava a atenção para o estudo e a análise da estatística judiciária, algo agora concretizado pelo anuário Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)”, declarou Kozikoski antes de passar a palavra aos painelistas.

Câmara começou sua apresentação relatando que releu a obra do homenageado sobre embargos infringentes em busca de referências para tratar do tema que lhe coube no seminário: a ampliação de colegiado, prevista no artigo 942 do Código de Processo Civil (CPC). “Está prevista a ampliação do colegiado diante de alguns casos. Nos de apelação e do agravo de instrumento, o colegiado passa de 3 para 5 magistrados. Mas por alguma razão, muitas vezes só quatro estão presentes e deixa-se de colher o quinto voto quando o resultado está 3 x 1. Fazer isso é desprezar a capacidade de influência do último magistrado. É perfeitamente possível que este convença os demais a mudar seu entendimento. O próprio CPC diz que o voto pode ser alterado enquanto não for proclamado o resultado definitivo. Com a prática, o quinto voto se converte em mera formalidade, tornando o julgamento incompleto e omisso”, afirmou.

Jardin

Mitidiero instigou o público ao anunciar seus tópicos, dentre os quais estavam os jardins. O painelista citou a lição recebida a respeito de um de seus primeiros escritos, um ensaio de 2005 em que empregou o conceito de jardineiro social presente da obra de Zygmunt Bauman para falar sobre a lei subjacente ao sistema de nulidades do Professor Egas. “Era uma analogia um pouco livre, de alguém que tinha 20 e poucos anos e pouca preocupação com o rigor dos conceitos. Dois anos depois, o professor Egas, após consultar o Professor (Luiz Guilherme) Marinoni sobre quem era Daniel Mitidiero, escreveu em resposta o ensaio sobre invalidades e jardinagem, publicado na Revista Forense. Com as críticas, aprendi a ter um compromisso muito sério com o que escrevo. Foi uma grande lição, dada de maneira gentil e séria”, contou.

Venturi abriu seu painel afirmando que a melhor forma de a academia homenagear o Professor Egas é manter viva sua contribuição para o Direito Processual brasileiro. “Tratarei do cabimento do mandado de segurança contra ato judicial a partir de um artigo referencial icônico publicado pelo Professor Egas em 1992. Como se sabe, o mandado de segurança não foi idealizado para atacar ato judicial. Daí que seu lugar tenta ser equalizado pelo sistema de justiça, que muitas vezes enxergou o MS como um inconveniente intruso, nunca convidado formalmente a protagonizar a impugnação de atos judiciais, na medida em que, para tanto, sempre operaram os recursos. É preciso desmistificar o emprego do mandado de segurança contra atos judicias, retirando-lhe a extrema excepcionalidade para que o sistema de justiça passe a vê-lo como remédio constitucional natural e necessariamente admissível para a adequação do devido processo legal e para a eficiente proteção dos direitos”, destacou.

Execução

A efetividade da execução e a desjudicialização da execução civil foram o tema do segundo painel, composto também por três painelistas: Rogéria Dotti, doutora em Direito, vice-presidente da Comissão do CPC no CFOAB e secretária-geral do Instituto Brasileiro de Direito Processual; José Miguel Garcia Medina, doutor em Direito Processual Civil e membro da Comissão de Acesso à Justiça da OAB Paraná; e Sandro Gilbert Martins, doutor em Direito e professor do Instituto Romeu Bacellar. A presidência de mesa ficou a cargo do promotor de justiça Eduardo Salomão Cambi, doutor em Direito e professor da Unopar. “É importante relembrar os que pavimentaram o caminho. O Professor Egas deixa muita saudade. Me lembro que seus memoriais não passavam de duas laudas. Além de grande advogado era muito objetivo”, afirmou Cambi ao abrir o painel.

Rogéria Dotti lembrou, inicialmente, da ocasião em teve alegria de obter do Professor Egas resposta afirmativa para o pedido de apresentação da edição comentada do Código de Processo Civil preparada pela OAB Paraná sob a gestão do presidente Juliano Breda. “No texto, ele contou algo ocorrido na passagem do Código de 1939 para 1973, quando um juiz entendeu não ser possível ouvir as testemunhas e redesignou o ato. O professor Egas relatou ter voltado ao fórum no dia seguinte para conversar com o magistrado, que lhe confessou que no novo Código, o de 1973, havia ilhas em que não aportara. O professor Egas era assim, sempre movido pelo profundo compromisso com o conhecimento e com o princípio de fazer o que é certo”, relatou ela. Rogéria tratou de temas atuais do processo civil à luz de três lições legadas pelo homenageado: a de que a efetividade da lei processual depende fundamentalmente da inteligência daqueles que a interpretam e a aplicam; a de que a infraestrutura é vital para haver efetividade no processo e a de que procedimentos extrajudiciais colaboram para desafogar o Judiciário.

Garcia Medina anunciou que trataria em sua fala da multa como medida coercitiva, tema de artigo do Professor Egas publicado em 1993. “O professor enalteceu o fato de o Código de 1973 ter previsto a multa como medida executiva de que poderia se valer o credor. Embora não tenha dito isso expressamente, ele faz referência a uma orientação então prevalecente na doutrina, seguida ainda hoje por autores de peso, no sentido de que a verdadeira tutela jurisdicional executiva se daria apenas através de meios sub-rogatórios ou de execução direta. Mas sabidamente essa forma é absolutamente ineficiente. Lembremos que o contexto em que o texto foi escrito é o de um período em que o Código do Consumidor era recente e não havia uma compreensão tão ampla sobre direitos fundamentais como temos hoje”, observou, fechando sua apresentação com abordagem sobre os limites à multa.

Diagnóstico

Martins também tomou o artigo de 1993 do Professor Egas como base para sua apresentação. “Verdadeiramente ele se mostrava preocupado com a falta de dados objetivos práticos para identificar problemas enfrentados que precisam ser tratados com atenção específica e não de modo genérico. Já se foram 28 anos. Agora temos os relatórios Justiça em Números do CNJ, mas os dados, são poucos. Faltam dados para a análise das especificidades, ou do que o professor chamava de estrangulamentos do processo. É preciso evoluir no Justiça em Números para saber, para com o levantamento de novos dados estatísticos, saber se é preciso implantar mais varas, redistribuir pessoal, adotar tecnologias. Enfim, aprimorar a efetividade da execução. Quanto aos intérpretes, não há dúvidas de que no momento em que o texto foi escrito havia pouca preocupação com a execução. Hoje, se dá o contrário. O Paraná, especialmente, é celeiro de bons doutrinadores”, apontou.