A pedido da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB nacional, os advogados Egon Bockmann Moreira e Rodrigo Kanayama elaboraram parecer jurídico apontando as inconstitucionalidades da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2023, conhecida como “PEC do calote nos precatórios”. O documento recomenda a rejeição integral da proposta aprovada na Comissão Especial da Câmara dos Deputados em 8 de julho, por entender que afronta cláusulas pétreas da Constituição, como os direitos à coisa julgada, à propriedade e à separação de Poderes.
O parecer feito para o Conselho Federal da OAB nasceu de um trabalho conjunto iniciado na OAB Paraná. A seccional, por meio de comissão constituída pelo presidente Luiz Fernando Casagrande Pereira, com advogados e especialistas, realizou trabalho técnico e colaborativo sobre os precatórios. O grupo levantou dados, construiu cenários e simulou os impactos da PEC 66/2023. A atuação conjunta permitiu compreender e demonstrar os efeitos da proposta sobre os credores.
Desequilíbrio
“A PEC nº 66/2023 viola direitos fundamentais dos credores atuais e das futuras gerações, que herdarão um passivo crescente e sem horizonte de quitação. Trata-se de um ciclo vicioso em que o Estado brasileiro, financiado por tributos pagos de forma compulsória, transfere para o futuro o custo de decisões judiciais já consolidadas, em flagrante desrespeito ao equilíbrio intertemporal das contas públicas”, afirmam os autores.
Os juristas chamam atenção, ainda, para o trâmite acelerado da proposta no Congresso Nacional, com sucessivas dispensas de prazos regimentais na Câmara dos Deputados e votação no Senado no dia seguinte ao seu recebimento. Segundo o parecer, a pressa legislativa compromete a legitimidade da norma promulgada e fragiliza o exercício legítimo do Poder Constituinte Derivado.
Consequências fiscais
No mérito, o parecer destaca que a PEC estabelece um teto de pagamento de precatórios que parte de 1% da Receita Corrente Líquida (RCL) e chega a 5% apenas quando o estoque de dívidas judiciais ultrapassa 80% da RCL — o que, na prática, torna a dívida impagável. Simulações mostram, por exemplo, que o Estado do Paraná, com R$ 8,6 bilhões em precatórios em 2025 (13,6% da RCL), teria redução no valor anual desembolsado, de R$ 1,48 bilhão para R$ 944 milhões, com projeções que indicam crescimento da dívida para mais de R$ 60 bilhões até 2080.
“Mesmo a alíquota máxima de 5% da RCL mostra-se insuficiente para quitar a dívida acumulada, especialmente diante da entrada contínua de novos precatórios. O resultado é uma dívida perpétua, em afronta direta ao entendimento do Supremo Tribunal Federal”, alertam.
Outro ponto criticado é a proposta de atualização dos valores devidos com base no IPCA acrescido de 2% ao ano em juros simples — ou pela Selic, o que for menor. Segundo o parecer, esse modelo contraria jurisprudência do STF que assegura a isonomia entre credores públicos e privados. “Perseverar na própria inadimplência converte-se em estratégia racional, dada a modicidade dos juros devidos ao credor.”
Calote perpétuo
Para Pereira, a aprovação da PEC representa um “calote perpétuo” de estados e municípios em relação a seus credores. Pereira cita o exemplo do Paraná. “Hoje o estado demora 17 anos para pagar um precatório. Municípios também levam muitos anos. Se a PEC passar o quadro se agrava. No Paraná a dívida dobra em dois anos. Além disso a PEC altera o critério de remuneração dos credores. A proposta é corrigir o valor em 2% ao ano, quando a taxa básica de juros está em 15% ao ano. Ou seja, o novo critério faz o credor perder dinheiro enquanto espera na fila sem fim. Muitas empresas quebraram e outras vão quebrar nessa espera. De todos os calotes dados por Emendas Constitucionais – e já foram cinco – esse é o mais grave. A dívida nunca mais será paga”, alerta.
A tramitação no Congresso está em fase avançada e a votação final no Senado está programada para o segundo semestre do ano. “O tempo é curto e a advocacia precisa reagir rapidamente para evitar essa tragédia”. Para embasar o alerta sobre o assunto, a OAB Paraná reuniu informações com projeções alarmantes sobre o Paraná e criou um simulador de pagamentos de precatórios que pode ser aplicado para analisar a situação de estados e municípios de todo o país. Acesse aqui. A seccional conclama os representantes do Congresso Nacional a rejeitar o texto, reafirmando seu compromisso com a defesa intransigente dos credores e da supremacia da Constituição.
Confira aqui a íntegra do parecer dos juristas paranaenses.
Com informações do CFOAB.




